LRF – NOÇÕES PRELIMINARES

O desequilíbrio fiscal, ou gastos sistematicamente superiores às receitas, predominou na administração pública no Brasil até recentemente. As conseqüências para a economia são bastante negativas, e, em alguns casos, têm impacto sobre mais de uma geração. A inflação descontrolada até o lançamento do Real, a convivência com taxas de juros muito altas, o endividamento público também expressivo e a carga tributária relativamente alta, quando comparada com nossos vizinhos, são algumas destas conseqüências.

Esta realidade levou as finanças públicas a uma situação tal, que acabou por limitar o atendimento de necessidades fundamentais da população, como saúde, educação, moradia, saneamento etc., com efeitos indesejáveis sobre sua parcela mais pobre, e que mais sofre os efeitos da ausência de investimentos governamentais nessas áreas.

Nesse contexto, a Lei de Responsabilidade Fiscal (LRF) representa um instrumento para auxiliar os governantes a gerir os recursos públicos dentro de um marco de regras claras e precisas, aplicadas a todos os gestores de recursos públicos e em todas as esferas de governo, relativas à gestão da receita e da despesa públicas, ao endividamento e à gestão do patrimônio público.

Além disso, a Lei consagra a transparência da gestão como mecanismo de controle social, através da publicação de relatórios e demonstrativos da execução orçamentária, apresentando ao contribuinte a utilização dos recursos que ele coloca à disposição dos governantes.

Entre o conjunto de normas e princípios estabelecidos pela LRF, alguns merecem destaque. São eles:

  • limites de gasto com pessoal: a lei fixa limites para essa despesa em relação à receita corrente líquida para os três Poderes e para cada nível de governo (União, Estados, Distrito Federal e Municípios);
  • limites para o endividamento público: serão estabelecidos pelo Senado Federal por proposta do Presidente da República;
  • definição de metas fiscais anuais: para os três exercícios seguintes;
  • mecanismos de compensação para despesas de caráter permanente: o governante não poderá criar uma despesa continuada (por prazo superior a dois anos) sem indicar uma fonte de receita ou uma redução de outra despesa; e
  • mecanismo para controle das finanças públicas em anos de eleição: a Lei impede a contratação de operações de crédito por antecipação de receita orçamentária (ARO) no último ano de mandato e proíbe o aumento das despesas com pessoal nos 180 dias que antecedem o final do mandato.

A obediência a essas novas regras vai permitir um ajuste fiscal permanente no Brasil, uma vez que a disciplina fiscal introduzida pela Lei proporcionará o fortalecimento da situação financeira dos entes da Federação. Isso, por sua vez, possibilitará o aumento da disponibilidade de recursos para o investimento em programas de desenvolvimento social e econômico.

A Lei de Responsabilidade Fiscal - LRF (Lei Complementar n0 101, de 4/5/2000), passa a regulamentar uma série de questões relacionadas à administração pública brasileira e para assegurar à sociedade que todos os Poderes da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios terão que obedecer, sob pena de severas sanções, aos princípios do equilíbrio das contas públicas, de gestão orçamentária e financeira responsável, eficiente, eficaz e, sobretudo, transparente. A transparência tem por objetivo garantir a todos os cidadãos, individualmente ou por meio das diversas formas em que costumam se organizar, acesso às informações que explicitam as ações praticadas pelos governantes, ações quando prevê ampla divulgação, inclusive por meios eletrônicos e realização de audiências públicas, dos planos, diretrizes orçamentárias, orçamentos, relatórios periódicos da execução orçamentária e da gestão fiscal, bem como das prestações de contas e pareceres prévios emitidos pelos tribunais de contas.

A nova lei alcança todas as esferas de Governo - União, Estados, Distrito Federal e Municípios - compreendendo os órgãos da administração direta de todos os Poderes e, no âmbito da administração indireta, inclusive autarquias, fundos, fundações e empresas estatais dependentes.

Embora a LRF reforce a integração efetiva entre os instrumentos de planejamento (Plano Plurianual - PPA, Lei de Diretrizes Orçamentárias - LDO e Lei Orçamentária Anual - LOA), ela não altera as regras básicas de preparação de tais instrumentos. Dessa forma, as antigas normas, particularmente a Lei nº 4.320, de 17-3-1964, continuam valendo para o processo de elaboração e execução orçamentária dos entes da Federação.

A Lei visa a regulamentar a Constituição Federal, na parte da Tributação e do Orçamento (Título VI), cujo Capítulo II estabelece as normas gerais de finanças públicas a serem observadas pelos três níveis de governo: Federal, Estadual e Municipal. Em particular, a LRF vem atender à prescrição do artigo 163 da CF de 1988, cuja redação é a seguinte:

“Lei complementar disporá sobre:
I - finanças públicas;
II - dívida pública externa e interna, incluída a das autarquias, fundações e demais entidades controladas pelo poder público;
III - concessão de garantias pelas entidades públicas; IV - emissão e resgate de títulos da dívida pública;
V - fiscalização das instituições financeiras;
VI - operações de câmbio realizadas por órgãos e entidades da União, dos
Estados, do Distrito Federal e dos Municípios;
VII - compatibilização das funções das instituições oficiais de crédito da União, resguardadas as características e condições operacionais plenas das voltadas ao desenvolvimento regional.”

A LRF não substitui nem revoga a Lei nº 4.320/64, que normatiza as finanças públicas no País mais de 40 anos. Embora a Constituição Federal tenha determinado a edição de uma nova lei complementar em substituição à Lei 4.320, não é possível prever quando o Congresso Nacional concluirá os seus trabalhos em relação ao projeto já existente. Entretanto, havendo divergências entre os dois dispositivos, prevalecerá o insculpido na LRF, por ser esta a Lei mais recente.

A LRF atende também ao artigo 169 da Carta Magna, que determina o estabelecimento de limites para as despesas com pessoal ativo e inativo da União a partir de Lei Complementar. Neste sentido, ela revoga a Lei Complementar n º 96, de 31 de maio de 1999, a chamada Lei Camata II (artigo 75 da LRF).

A LRF atende ainda à prescrição do artigo 165 da Constituição, mais precisamente, ao inciso II do parágrafo 9º. De acordo com este dispositivo,

...Cabe à Lei Complementar estabelecer normas de gestão financeira e patrimonial da administração direta e indireta, bem como condições para a instituição e funcionamento de Fundos”.

Finalmente, a partir do seu artigo 68, a LRF vem atender à prescrição do artigo 250 da Constituição de 1988, que assim determina:

“Com o objetivo de assegurar recursos para o pagamento dos benefícios concedidos pelo regime geral de previdência social, em adição aos recursos de sua arrecadação, a União poderá constituir fundo integrado por bens, direitos e ativos de qualquer natureza, mediante lei, que disporá sobre a natureza e administração desse fundo.”