GESTÃO FISCAL RESPONSÁVEL

O conceito de gestão fiscal responsável adotado pela LRF é estabelecido no § 1º do artigo 1º e se refere a um conjunto de doze pontos, todos de obediência obrigatória e responsabilização punitiva para os casos em que esta não se verificar. São eles:

a) Ação planejada e transparente

Ações planejadas são as que resultam de um planejamento previamente estabelecido, com o intuito de garantir no tempo adequado a disponibilidade dos meios necessários (materiais e imateriais) para execução de uma dada atividade ou tomada de decisão relevante, passíveis de controle imediato.

Quanto à forma de sua divulgação, as ações planejadas podem ser transparentes, semi-transparentes ou não transparentes. O primeiro caso é o que a LRF exige como segunda característica principal das ações desempenhadas pelos gestores públicos e que pode ser definida como aquele em que as intenções são aparentes (tanto no “fazer” como em “quem o faz”).

As ações transparentes respondem ao seguinte conjunto de questões: o que pode ser planejado (o objeto); como está sendo planejado (a forma); quem está planejando (o autor ou agente) e quando e onde se planeja (estrutura dos custos).

 b) Prevenção de riscos e correção de desvios

Prevenir riscos, em termos técnicos, significa diagnosticar e identificar os reais problemas e suas causas principais.

Já a correção de desvios requer acentuada vontade política para que sejam procedidas as mudanças necessárias ao ajustamento. Implica em atuar de forma eficiente e eficaz para rever ter aquilo que está causando o afastamento dos objetivos. Requer, para tanto, que o gestor esteja munido de parâmetros (sem os quais não será possível detectar o afastamento das metas) e atue sempre que não forem alcançadas as metas e objetivos estabelecidos no planejamento.

Este requisito de gestão responsável determinado pela LRF leva-nos a refletir sobre causas, ou seja, que elementos podem impactar negativamente a execução dos planos. Esta análise faz-se necessária na medida em que nem todos os riscos podem ser per feitamente previstos, e nem todos podem ter os seus efeitos minimizados pela ação humana. Contudo, para que os desvios sejam corrigidos, terão que ser necessariamente identificados, e a maneira mais fácil para fazer isto é comparar os dados da execução das ações com os dados do que se pretende obter (parâmetros do planejamento).

Ao estabelecer a prevenção de riscos e conseqüente correção dos desvios, o legislador teve o cuidado de encerrar o ciclo administrativo que se inicia pelo planejamento, passa pela execução e se encerra no controle, que representa o elemento de retroalimentação deste sistema, conforme demonstramos na figura a seguir:

c) Não afetação do equilíbrio das contas públicas

Os orçamentos equilibrados voltam a ser premissas essenciais ao desenvolvimento das nações, o que leva a um duro combate ao descompasso fiscal.

Até 1929, a gestão das economias nacionais era exigente quanto ao equilíbrio dos orçamentos, cumprindo a máxima de que as despesas nunca podem ser maiores do que as receitas.

Esta posição encontrava respaldo na realidade da época, em que o Poder Público apenas desempenhava ações que garantissem a segurança e a defesa nacional; assegurassem o direito à justiça, produzindo leis e, em alguns países, assegurassem um ensino público básico, mas de qualidade. Era este o resumo da atividade estatal.

A grande depressão mundial, particularmente desencadeada pela quebra da Bolsa de Valores de Nova York (1929), impeliu os Governos a aportar recursos na economia, garantindo investimentos em infra-estrutura para atenuar as freqüentes crises dos mercados. Tais medidas, embora favorecessem os sistemas econômicos, resgataram a figura do déficit público.

As crises nas economias individuais dos países, intensificadas a partir da década de 80, aliadas à falência dos sistemas socialistas e à insuficiente capacidade de investimentos do setor governo, revitalizaram as abordagens iniciais do equilíbrio orçamentário, fazendo com que o Estado retomasse as suas antigas funções, o que o leva a militar com compromissos de saúde financeira de longo prazo.

As medidas necessárias à adoção deste princípio vão além da manutenção das despesas dentro dos limites da receita. Os gestores públicos deverão assumir posturas estratégicas adequadas ao perfil estrutural da comunidade que administra, não cedendo às pressões para atendimento às necessidades de uns poucos.

d) Cumprimento das metas de resultado entre as receitas e as despesas.

Mais uma vez o legislador valoriza o princípio do planejamento orçamentário, estabelecendo condições para o exercício do controle social, pois as metas de resultado não poderão ser encaradas pelos gestores públicos como o preenchimento obrigatório de um formulário legal.

 A LRF estabeleceu a obrigatoriedade de que as metas de resultado primário e nominal (artigo 4º, I e § 1º) sejam definidas na Lei de Diretrizes Orçamentárias, devendo os órgãos de Controle e Fiscalização acompanhar-lhes o cumprimento.

Em suma, os resultados pactuados no Anexo de Metas Fiscais deverão ser fielmente perseguidos, pois, caso seja ameaçado, os gestores estarão obrigados a adotar as medidas de contenção de despesas preceituadas no artigo 9º.

e) Condições e restrições para impedir desvios nas ações governamentais e simultaneamente, padronizar ações para facilitar o seu efetivo controle.

Se nos cinco pontos iniciais foram estabelecidos os objetivos que se pretende alcançar com a gestão fiscal responsável, os sete pontos restantes visam padronizar procedimentos, de forma que possam ser objeto de comparação para fins de controle.

Ressalte-se que o legislador não abordou as minúcias dos procedimentos, visto que estas eram de caráter discricionário ao gestor. Foram estabelecidas orientações gerais e restrições de aplicabilidade, de modo que as ações possam ser avaliadas e seu resultado mensurado.

Tais condições são relativas à:

  1. Renúncia de receita;
  2. Geração de Despesas com Pessoal;
  3. Geração de Despesas com a Seguridade Social e outras;
  4. Geração de Despesas com as Dívidas Consolidada e Mobiliária;
  5. Operação de Crédito, inclusive por Antecipação da Receita;
  6. Concessão de garantias;
  7. Inscrição em Restos a Pagar.

Em síntese, a gestão fiscal responsável tem como finalidade o fortalecimento das condições essenciais à estabilidade de preços e ao crescimento econômico sustentável, trazendo por conseqüência a geração de empregos e de renda e o bem-estar social. A regulação deste objetivo é verificada nos seguintes princípios:

  1. Garantir que as necessidades e anseios da sociedade, quanto à atuação governamental, seja compatibilizada com a receita própria efetiva do Ente, ou seja, custeamento das ações estatais com seus próprios recursos, prevenindo a ocorrência de déficits permanentes, recorrentes e crescentes;
  2. Garantir que a aplicação de recursos seja feita, adotando uma margem de segurança, que permita ao Ente absorver os casos fortuitos sem acrescer o volume da dívida pública;
  3. Gerir organizadamente a dívida, no principal e seus custos, evitando que a arrecadação seja desequilibrada com tais gastos;
  4. Preservar o patrimônio público;
  5. Assegurar a arrecadação efetiva de todos os recursos a que o Ente faz direito, através da adoção de uma política tributária previsível e estável;
  6. Limitar os gastos continuados de modo a impedir impactos financeiros negativos no futuro, através de medidas compensatórias a estes gastos;
  7. Administrar prudentemente os passivos contingentes (riscos de prejuízos financeiros, como perdas judiciais), compatibilizando a sua possibilidade de ocorrência com o fluxo financeiro do Ente;
  8. Adotar permanentemente o planejamento como orientador da ação estatal, valorizando a importância do Plano Plurianual, Diretrizes Orçamentárias e Orçamentos Anuais como instrumentos interligados e de observação obrigatória;
  9. Desmistificar a linguagem até então adotada quando da divulgação dos dados contábeis e orçamentários dos Entes Públicos, possibilitando a sua compreensão pela sociedade (substituir o “contabilês”);
  10. Limitar o endividamento à efetiva capacidade de pagamento de cada Ente (não é proibida a contração de dívidas, mas o será sempre que os pagamentos não puderem ser suportados pelas disponibilidades financeiras);
  11. Tornar prudente a administração financeira e patrimonial dos Entes Públicos, condicionando o aumento da atividade estatal à efetiva capacidade financeira, planejando previamente as medidas corretivas que serão adotadas para eliminar os desvios dos planos e estruturando as despesas de cada Ente de forma ordenada e em percentuais tais que permitam o atendimento efetivo aos anseios sociais.

OS DEZ MANDAMENTOS DA LRF SEGUNDO O PROF. ILVO DEBUS

I – Não terás crédito orçamentário com finalidade imprecisa, nem dotação ilimitada (Art. 5º, § 4º);

II – Não farás investimento que não conste do Plano Plurianual (Art. 5º § 5º);

III - Não criarás nem aumentarás despesa sem que haja recursos para o seu custeio (Art. 17, § 1º);

IV – Não deixarás de prever e arrecadar os tributos de tua competência (Art. 11);

V – Não aumentarás a despesa com pessoal nos últimos seis meses do teu mandato (Art. 21,II, § único);

VI – Não aumentarás a despesa com seguridade social sem que a sua fonte de custeio esteja assegurada (Art. 24);

VII – Não utilizarás recursos recebidos por transferência para finalidade diversa daquela que foi pactuada (Art. 25, § 2º);

VIII – Não assumirás obrigação para com teus fornecedores, para pagamento a posterior, de bens e serviços (Art. 37, IV);

IX – Não realizarás operação de ARO (Antecipação da Receita Orçamentária) sem que tenhas liquidado a anterior (Art. 38, IV, “a”);

X – Não utilizarás receita proveniente de alienação de bens para o financiamento de despesas correntes (Art.44).