REGIME CONTÁBIL

Considerações Gerais

A Lei no 4.320/64, em seu artigo 35, determina que “pertencem ao exercício financeiro as receitas nele arrecadadas e as despesas nele legalmente empenhadas”.

Para muitos doutrinadores, o artigo em comento resultou por consagrar o regime contábil misto para a Contabilidade Aplicada à Administração Pública, no Brasil, ou seja, Regime de Caixa para as Receitas (as receitas nele arrecadadas pelo ingresso dos recursos financeiros), e Regime de Competência para as Despesas (as despesas legalmente empenhadas no exercício financeiro).

No entanto, não se pode esquecer que a Resolução CFC nº 750/1993, que cuida dos Princípios Fundamentais de Contabilidade, dispõe, ao tratar do princípio da Competência, que o reconhecimento das receitas não se limita aos seus recebimentos.

“Art. 9º As receitas e as despesas devem ser incluídas na apuração do resultado do período em que ocorrerem, sempre simultaneamente quando se correlacionarem, independentemente de recebimento ou pagamento.

§ 1º O Princípio da COMPETÊNCIA determina quando as alterações no ativo ou no passivo resultam em aumento ou diminuição no patrimônio líquido, estabelecendo diretrizes para classificação das mutações patrimoniais, resultantes da observância do Princípio da OPORTUNIDADE.

§ 2º O reconhecimento simultâneo das receitas e despesas, quando correlatas, é conseqüência natural do respeito ao período em que ocorrer sua geração.

§ 3º As receitas consideram-se realizadas:
I – nas transações com terceiros, quando estes efetuarem o pagamento ou assumirem compromisso firme de efetivá-lo, quer pela investidura na propriedade de bens anteriormente pertencentes à ENTIDADE, quer pela fruição de serviços por esta prestados;
II – quando da extinção, parcial ou total, de um passivo, qualquer que seja o motivo, sem o desaparecimento concomitante de um ativo de valor igual ou maior;
III – pela geração natural de novos ativos independentemente da intervenção de terceiros;
IV – no recebimento efetivo de doações e subvenções.

§ 4º Consideram-se incorridas as despesas:
I – quando deixar de existir o correspondente valor ativo, por transferência de sua propriedade para terceiro;
II – pela diminuição ou extinção do valor econômico de um ativo;
III – pelo surgimento de um passivo, sem o correspondente ativo.”

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

Assim, para muitos doutrinadores, o art. 35 da Lei nº 4.320/1964 contraria o Princípio contábil da Competência, quando determina que só devem ser consideradas, dentro do exercício financeiro, as receitas nele arrecadadas, enquanto aquele Princípio consagra que as receitas devem ser consideradas, em função da ocorrência do seu fato gerador, independentemente, do seu recebimento.

O fato gerador da receita, a entrega do serviço ou do material ao contratante, independe do recebimento do valor correspondente à prestação do serviço ou da venda do bem ou material.

Temos que diferenciar as receitas orçamentárias das receitas consideradas para os fins de apuração do resultado do exercício, pois nem toda receita orçamentária vai afetar a situação líquida patrimonial.

Os fatos permutativos, por exemplo, constituem receitas orçamentárias, por representarem alienações de bens e direitos ou operações de créditos, sem tampouco afetarem a situação patrimonial, por não se tratar, na realidade, de uma receita, para efeito de resultado, e sim de uma troca de bens ou direitos ou obrigações, por dinheiro.

É bom esclarecer que o legislador, quando se referiu, no artigo 35, da Lei nº 4.320/64, às receitas e despesas queria, apenas, atingir as receitas e despesas que poderiam afetar o orçamento e não, a situação patrimonial que deverá ser norteada pelo Princípio de Competência.

Conforme se observa, na Contabilidade Pública, o regime contábil deve ser classificado de duas maneiras. A primeira quando nos referimos ao orçamento, e, nesse particular, a lei deixou bem claro que, na receita, devemos adotar o regime de caixa e, na despesa, o de competência. A segunda, quando fazemos referencia aos Princípios Contábeis estabelecidos pelo Conselho Federal de Contabilidade, que prescreveu, no Princípio de Competência, a obrigatoriedade das receitas e despesas serem consideradas em função do seu fato gerador e não em função do seu recebimento ou pagamento.

 Regime Contábil da Receita

Na Administração Pública, temos receitas de prestação de serviços, de vendas materiais e cobrança de tributos. Nos dois primeiros casos, o fato gerador é perfeitamente identificado e a contabilização da receita segue, integralmente, o Princípio de Competência, quando se adotam os procedimentos a seguir.

Pela emissão da fatura quando da entrega do serviço ou do material ao contratante, o beneficiário da receita faz a sua contabilização da seguinte forma:

Contas a Receber (Ativo)
a Variações Ativas (Resultado)

No recebimento do direito, temos:

Diversos
a Diversos
Bancos (Ativo)
Variações Passivas (Resultado)
a Contas a Receber (Ativo)
a Receita Orçamentária (Resultado)

Na contabilização das receitas tributárias, o fato gerador é difícil de ser identificado, pois não existe uma prestação de serviço anterior, uma vez que os governos arrecadam os tributos federais, estaduais e municipais e prestam os serviços essenciais, definidos pela Constituição e outros definidos em suas metas para aquele exercício; daí dizer-se que a receita é contabilizada pela sua arrecadação, e não pela ocorrência do seu fato gerador. Ocorre, porém, que os tributos que não são arrecadados, nos seus prazos de vencimento, são registrados, como Dívida Ativa contrariando o dispositivo da citada lei e seguindo o princípio de competência.

Poderíamos definir como fato gerador da Receita, o estágio do lançamento mas, também, é difícil a sua identificação, em determinados tributos. O imposto de renda, por exemplo: - o lançamento no momento da leitura das declarações dos contribuintes e a verificação do valor a receber ou a restituir a cada um. Neste caso, teríamos receita ou despesa, para o Tesouro Nacional, no momento do lançamento, caso em que a Receita Federal não dispõe de mecanismos de controle para fornecer as informações adequadas aos órgãos de Contabilidade Analítica.

Por esses motivos, na contabilização das receitas tributárias optou-se pelo registro, no momento do recolhimento, dentro dos prazos previstos na legislação.

Na contabilização da receita, teremos:

Bancos (Ativo)
a Receita orçamentária (Resultado)

Quando não ocorre o recolhimento, o registro da receita é efetuado na cobrança da Dívida Ativa da União, conforme lançamentos abaixo:

Dívida Ativa (Ativo)
a Variações Ativas (Resultado)

Neste caso, a Receita Orçamentária será afetada, na cobrança da Dívida Ativa, e aí teremos a contabilização de um fato permutativo (não afeta o resultado, embora se registre receita orçamentária):

Bancos (Ativo)
a Receita Orçamentária (Resultado credor)

Variações Passivas (Resultado devedor)
a Dívida Ativa (Ativo)

Regime Contábil da Despesa

O regime contábil da despesa já está consagrado, na Lei nº 4.320/64, como sendo o de competência, não havendo, portanto, divergência entre a Lei e o Principio de Competência, definido pelo Conselho Federal de Contabilidade.
 
De acordo com o Princípio de Competência, a despesa será considerada em função do seu fato gerador, ou seja, o recebimento dos serviços e consumo dos bens ou materiais.

Quando se examina a despesa, no decorrer do exercício financeiro, o Princípio de Competência é perfeitamente respeitado, com a exceção da Depreciação (uso dos bens de natureza permanente) que não é feita pela Administração Pública direta, autárquica e fundacional.

Ao se examinar a despesa, no final do exercício, deparamos com a figura dos "Restos a Pagar - Não Processados" que são valores levado ao resultado do exercício, sem que o fato gerador da despesa tenha, ainda, ocorrido, contrariando o Princípio de Competência que define a apropriação da despesa, somente, após a ocorrência do seu fato gerador. Para a Contabilidade Pública, o momento da apropriação da despesa, ao final do exercício, seria o do empenho e, durante o exercício seria o consumo dos bens ou o recebimento dos serviços.